Castelo Rá-Tim-Bum: o filme (Castelo Rá-Tim-Bum: o filme, 1999)
- Pedro Alves
- 17 de abr. de 2019
- 10 min de leitura
Atualizado: 4 de jun. de 2022

Uma pipa esvoaça sem rumo sendo emoldurada por gigantescos arranha-céus. Ela paira até ultrapassar os gigantescos portões de um castelo, seguida de perto por três crianças. Um menino comenta amedrontado sobre a construção servir de morada para bruxos, mas logo vira motivo de gozação pela única garota do trio. Ao adentrarem pelos jardins a procura da pipa perdida, os jovens se deparam com os três habitantes do castelo; os três bruxos. Para os espectadores que já acompanhavam assiduamente o seriado de televisão, duas das figuras foram facilmente reconhecidas: tanto a Morgana interpretada pela atriz Rosi Campos, quanto o Dr. Victor vivido por Sérgio Mamberti. Contudo, o personagem principal, Antônino “Nino” Stradivarius — anteriormente vivido por Cássio Scapin — fora drasticamente reformulado e, no longa-metragem, passou a ser interpretado por um menino de 13 anos. Uma metamorfose substancial na mitologia já conhecida.

Cao Hamburger, diretor tanto da série de TV quanto do filme, explica no making off do longa-metragem que a ideia da narrativa era apresentar uma releitura da história do seriado. É perceptível o que foi reaproveitado no cânone dos episódios de origem e o que foi totalmente descartado. Estão presentes no filme os interpretes dos tios do protagonista inseridos tal qual são no Castelo Rá-Tim-Bum da TV Cultura (os já citados Morgana e Victor), assim como o antagonista Dr. Abobrinha (Pascoal da Conceição). Contudo, do protagonista ao próprio espaço do castelo, todo o resto havia sido reformulado.

Em 9 de maio de 1994, estreava Castelo Rá-Tim-Bum na televisão brasileira. Mesmo antes de seu lançamento, o seriado já chamava atenção da mídia e público em matérias sobre a construção do cenário. Em uma matéria exibida em abril desse mesmo ano no canal, uma repórter registrou a construção dos cenários colhendo depoimentos dos trabalhadores, que iam dos cenógrafos até os carpinteiros. Logo em seguida, quando a construção estava quase completa, ela instigava o interesse dos espectadores passeando pelos cômodos do castelo e levantando questionamentos singulares, o que muito lembrava a estratégia de Alfred Hitchcock em seu clássico trailer de ‘Psicose’ (1960).
Durante o período de sua exibição original que foi de 9 de maio de 1994 a 24 de dezembro de 1997, o seriado educativo quebrou recordes em seu canal. Em apenas dois episódios, ele dobrou os picos de audiência da TV Cultura que possuía de 3 a 4 pontos no IBOPE com o predecessor do programa, ‘Glub-Glub’, para 8 pontos. Após uma semana de exibição, esse número saltou para 10 pontos, e, ao longo da exibição, atingiu ápices de 13 pontos.
Castelo Rá-Tim-Bum teve 4 temporadas; 90 episódios e 1 especial de natal; foi considerado pela Associação Paulista de Críticos de Arte como melhor programa infantil de 1994; 97% de suas gravações ocorreram em um único estúdio; e a reunião de todo seu material gravado totalizaria mais de 6 mil horas.
Após o sucesso estrondoso do Castelo Rá-Tim-Bum, uma adaptação cinematográfica era mais do que esperada, e em 1999 — dois anos após o término do programa — ela foi lançada. O filme foi vagamente baseado na série de televisão, sem nenhuma continuidade de enredo e com a adição de novos personagens.
Usando como referência novamente o vídeo de bastidores do longa-metragem, é perceptível a preocupação diretor Cao Hamburger com os detalhes da narrativa. A todo o momento, ele explicita que o filme foi produzido para que a equipe conseguisse explorar outros elementos da mitologia do seriado; elementos que o diretor julgava “mais cinematográficos”. Como decisão de direção para o seu primeiro longa-metragem, Hamburger resolveu sumir com o caráter educativo do programa de TV e dar mais realismo ao universo dos bruxos. Em relação a isso, Hamburger sublinha que:
Logo que estreou, veio a vontade de adaptar para o cinema, porque achei que tinha elementos naquele universo que eram mais cinematográficos e que não dava para explorar na televisão. A ideia, que surgiu em 1996, somente se viabilizou em 1999. Fui percebendo que quanto mais me afastava da série nas coisas formais, mantendo somente o conteúdo e a trama, melhor ia ser para o filme. De certa forma, o tempo de maturação foi benéfico para eu estar mais livre. Daí foi um exercício de esquecer o que foi feito na televisão e ficar com o essencial.
O filme não exibia lições recitadas para os espectadores tal qual fazia o seriado. O respeito às diferenças é a única “moral” apresentada, quando Nico admite sua condição de bruxo: “Não somos estranhos. Somos apenas… diferentes”. Sobre isso, João Batista Melo, escritor do livro Lanterna Mágica: Infância e Cinema Infantil escreve:
Por trás dessa mensagem, existe um inteligente recado às crianças. Elas mesmas, em muitos momentos, podem sentir-se diferente dos adultos, não tendo os mesmo direitos, não fazendo as mesmas coisas. Naturalmente, nada disso é percebido de forma consciente pelo espectador infantil. E aí Castelo Rá-Tim-Bum — O filme se aproxima de seus grandes antepassados, os contos de fadas, quando fala ao inconsciente da criança que ela não é um ser estranho. Além disso, é transmitido um valor de respeito às diferenças e de incentivo à diversidade.
Castelo Rá-Tim-Bum : o filme foi orçado em 7,5 milhões de reais e apresentou Diegho Kozievitch no papel de Nino, o aprendiz de feiticeiro. Escolhido entre mais de 150 candidatos, o ator curitibano deu o realismo ao personagem principal que o diretor procurava. A peculiaridade que ligava o programa da TV Cultura a Chaves de Roberto Gómez Bolaños acabou sendo extinta. Agora, Nino não seria interpretado por um ator adulto no papel de uma criança; Diegho realmente possuía a aparência que o personagem deveria ter: 13 anos — por mais que, no cânone, o personagem fosse um menino de “apenas” 300 anos. Castelo Rá-Tim-Bum : O Filme foi orçado em 7,5 milhões de reais e apresentou Diegho Kozievitch no papel de Nino, o aprendiz de feiticeiro. Escolhido entre mais de 150 candidatos, o ator curitibano deu o realismo ao personagem principal que o diretor procurava. A peculiaridade que ligava o programa da TV Cultura a Chaves de Roberto Gómez Bolaños acabou sendo extinta. Agora, Nino não seria interpretado por um ator adulto no papel de uma criança; Diegho realmente possuía a aparência que o personagem deveria ter: 13 anos — por mais que, no cânone, o personagem fosse um menino de “apenas” 300 anos.

Uma das coisas que mais chamam atenção na produção é, sem sombra de dúvidas, a direção de arte. O filme foi premiado no Grande Prêmio Cinema Brasil na categoria Melhor Direção de Arte e não foi por acaso. A equipe técnica aliou processos artesanais a tecnologia para conseguir aliar os valores e ensinamentos das histórias tradicionais de encantamentos a uma linguagem cinematográfica contemporânea. O filme consegue transportar fadas, bruxas, feiticeiras, heróis e castelos para a contemporaneidade, no cenário de uma grande cidade, sem perder a poesia. É sabido que nada disso seria possível sem um trabalho conjunto excepcional de toda a equipe técnica — desde a direção, passando pela direção de arte, fotografia e montagem.
A arte ficou a cargo de Clóvis Bueno e Vera Hamburger. Nos cenários, figurinos, objetos e bonecos, eles optaram por um tratamento realista que misturava referências de diferentes épocas. Podemos perceber isso claramente no Hall do castelo: nas paredes, estão pinturas rupestres; no chão, um piso art nouveau. Os objetos cenográficos como a escultura do jardim, o astrolábio, o telescópio e o relógio do universo foram criados especialmente para o filme; já os outros, vieram de antiquários, museus e de coleções particulares. A aparência do castelo também foi modificada: ao invés da tradicional maquete (usada durante a série de televisão), o Palácio dos Cedros, no bairro Ipiranga, em São Paulo, serviu de locação para as cenas externas.
Junto a isso também estavam os figurinos de Verônica Julian e maquiagem e cabelos, feitos sob a supervisão de Fábio Namatame, que ressaltavam a personalidade dos personagens os deixando com aparências mais caricaturais para serem mais palatáveis para o público-alvo infantil. Destacam-se dois personagens: Rato e a vilã Losângela. Matheus Nachtergaele, intérprete de Rato, adotou todos os trejeitos do roedor; possuindo um penteado que lembrava as duas orelhas de um rato e usando óculos que aumentavam seus olhos o deixando mais excêntrico. Já Losângela, possui cabelos coloridos que, no instante em que a personagem consegue o poder que caçava, se arrepiam e passam a ser apontados para cima — transformando em um signo para as feiticeiras poderosas.
Já a direção de fotografia de Marcelo Durst tem seus dois extremos durante a alternância do bem e do mal no domínio do castelo. No começo da narrativa, quando a harmonia reina no castelo, as fontes de luz são quentes e fazem com que os tons de pele pareçam saudáveis. Quando a feiticeira Losânagela rouba o poder, é como se ela também roubasse toda a luz do mundo. Isso cria uma tensão progressiva perceptível tanto para os espectadores que já conhecem os códigos audiovisuais presentes no cinema, quanto para as crianças que vão percebendo que alguma coisa está errada, por mais que seja apenas uma sensação.
Finalizando a arte estão os efeitos especiais. Estes foram criados na França por um estúdio de pós-produção. Por mais que com um olhar atual, os efeitos podem aparentar datados; na época de lançamento, foram bastante exaltados pelo público e crítica nacional. Falando em público, ‘Castelo Rá-Tim-Bum : o filme’ figurou entre os filmes de maior bilheteria de 1999, ficando na segunda posição com 725.329 ingressos, perdendo apenas para ‘O Auto da Compadecida’. A receita gerada pelo filme foi de R$ 3.031.875 que, por mais que tenha sido um considerável “fracasso” tendo em vista o orçamento de mais de R$ 7 milhões, foi uma grande surpresa para a distribuidora Columbia. Uma das coisas que mais chamam atenção na produção é, sem sombra de dúvidas, a direção de arte. O filme foi premiado no Grande Prêmio Cinema Brasil na categoria Melhor Direção de Arte e não foi por acaso. A equipe técnica aliou processos artesanais a tecnologia para conseguir aliar os valores e ensinamentos das histórias tradicionais de encantamentos a uma linguagem cinematográfica contemporânea. O filme consegue transportar fadas, bruxas, feiticeiras, heróis e castelos para a contemporaneidade, no cenário de uma grande cidade, sem perder a poesia. É sabido que nada disso seria possível sem um trabalho conjunto excepcional de toda a equipe técnica — desde a direção, passando pela direção de arte, fotografia e montagem.
A arte ficou a cargo de Clóvis Bueno e Vera Hamburger. Nos cenários, figurinos, objetos e bonecos, eles optaram por um tratamento realista que misturava referências de diferentes épocas. Podemos perceber isso claramente no Hall do castelo: nas paredes, estão pinturas rupestres; no chão, um piso art nouveau. Os objetos cenográficos como a escultura do jardim, o astrolábio, o telescópio e o relógio do universo foram criados especialmente para o filme; já os outros, vieram de antiquários, museus e de coleções particulares. A aparência do castelo também foi modificada: ao invés da tradicional maquete (usada durante a série de televisão), o Palácio dos Cedros, no bairro Ipiranga, em São Paulo, serviu de locação para as cenas externas.
Junto a isso também estavam os figurinos de Verônica Julian e maquiagem e cabelos, feitos sob a supervisão de Fábio Namatame, que ressaltavam a personalidade dos personagens os deixando com aparências mais caricaturais para serem mais palatáveis para o público-alvo infantil. Destacam-se dois personagens: Rato e a vilã Losângela. Matheus Nachtergaele, intérprete de Rato, adotou todos os trejeitos do roedor; possuindo um penteado que lembrava as duas orelhas de um rato e usando óculos que aumentavam seus olhos o deixando mais excêntrico. Já Losângela, possui cabelos coloridos que, no instante em que a personagem consegue o poder que caçava, se arrepiam e passam a ser apontados para cima — transformando em um signo para as feiticeiras poderosas.
Já a direção de fotografia de Marcelo Durst tem seus dois extremos durante a alternância do bem e do mal no domínio do castelo. No começo da narrativa, quando a harmonia reina no castelo, as fontes de luz são quentes e fazem com que os tons de pele pareçam saudáveis. Quando a feiticeira Losânagela rouba o poder, é como se ela também roubasse toda a luz do mundo. Isso cria uma tensão progressiva perceptível tanto para os espectadores que já conhecem os códigos audiovisuais presentes no cinema, quanto para as crianças que vão percebendo que alguma coisa está errada, por mais que seja apenas uma sensação.
Finalizando a arte estão os efeitos especiais. Estes foram criados na França por um estúdio de pós-produção. Por mais que com um olhar atual, os efeitos podem aparentar datados; na época de lançamento, foram bastante exaltados pelo público e crítica nacional. Falando em público, ‘Castelo Rá-Tim-Bum — O filme’ figurou entre os filmes de maior bilheteria de 1999, ficando na segunda posição com 725.329 ingressos, perdendo apenas para ‘O Auto da Compadecida’. A receita gerada pelo filme foi de R$ 3.031.875 que, por mais que tenha sido um considerável “fracasso” tendo em vista o orçamento de mais de R$ 7 milhões, foi uma grande surpresa para a distribuidora Columbia.

As filmagens do longa-metragem ocorreram de abril a junho de 1999 e foram realizadas em um galpão adaptado na cidade de Cajamar próxima a São Paulo. Foi escolhido esse galpão por conta do silêncio necessário para que ocorresse a gravação do som direto e por conta dos 2,5 mil m² que o terreno possuía; o que se fez necessário para abrigar os cenários de grandes dimensões. Por fim, a trilha sonora original foi composta por André Abujamra que criou uma obra sinfônica com toques de música eletrônica. É inegável a influência do Castelo Rá-Tim-Bum na contemporaneidade. Com a exposição feita para comemorar os 20 anos do seriado e todo hype criado ao seu redor resultando na necessidade dos centros culturas criarem um horário de visitação durante a madrugada, já que o número de ingressos não estava dando vasão aos interessados; podemos ver que não é o caso de um sucesso geracional e que foi esquecido, mas que continua em voga até os dias atuais tendo seus episódios reprisados incansavelmente durante horários variados. Já o filme, abriu espaço tanto para uma parceria mais próxima entre a distribuidora Columbia com o cinema nacional, ao mesmo tempo em que reafirmou a existência de um grande público para o cinema infantil — mesmo com o declínio de público em filmes do tipo no fim dos anos 90 e começo dos 2000. Principalmente em produções bem trabalhadas e que não menosprezassem a inteligência do seu público-alvo.
BIBLIOGRAFIA
‘CASTELO’ DOBRA AUDIÊNCIA DA CULTURA http://www.tv-pesquisa.com.puc-rio.br/mostraregistro.asp?CodRegistro=25068 (acessado em 05 de abril de 2019) Seriado Castelo Rá-Tim-Bum no IMDB http://www.imdb.com/title/tt0331732 (acessado em 05 de abril de 2019) Columbia aposta no cinema brasileiros http://cultura.estadao.com.br/noticias/cinema,columbia-aposta-no-cinema-brasileiro,20010403p1802 (acessado em 05 de abril de 2019) “Desconstruindo o Castelo — O Boom do Rá-Tim-Bum” https://www.youtube.com/watch?v=u7Xu_8euXKQ (acessado em 05 de abril de 2019) Making of Castelo Rá-Tim-Bum! https://www.youtube.com/watch?v=tugZDzr48f0 (acessado em 05 de abril de 2019) Making Off do filme (50 minutos) produzido pela TV Cultura e presente no DVD do filme MELO, João Batista. Lanterna Mágica: infância e cinema infantil. Rio de Janeiro, 2011.
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